Edição 345
Os ativos privados ganham relevância no portfólio dos brasileiros ano após ano. Investidores institucionais e as famÃlias passaram a discutir a alocação em estratégias como Private Equity, Venture Capital, Infraestrutura, Imobiliário e Florestal nas últimas duas décadas. O volume dos investimentos aumenta nos momentos de baixa da taxa de juros, realidade cada vez mais comum para os investidores locais.
A impossibilidade de resgate das posições a qualquer tempo, como nos investimentos em ações e renda fixa, é uma importante caracterÃstica dessa classe de ativos. O investidor que deseja se desfazer de suas posições deve buscar compradores por meio do mercado secundário não organizado, dado a natureza ilÃquida do ativo.
O mercado de secundários teve inÃcio no final da década de 80 com o surgimento de fundos dedicados a oferecer liquidez a ativos privados como Pantheon Ventures, Landmark Partners, Coller Capital, Paul Capital e Lexington Partners com volume pouco expressivo no ambiente internacional. Novos entrantes surgiram e o volume de secundários cresceu expressivamente a partir dos anos 2000, após a bolha da internet. O mercado ganhou enorme tração impulsionado pela necessidade de liquidez de grandes instituições financeiras por conta da crise do crédito imobiliário dos Estados Unidos em 2008. Atualmente, cerca de 100 bilhões de dólares são negociados anualmente em transações secundárias de ativos privados pelo mundo.
Transações no mercado secundário foram incomuns no Brasil ao longo dos anos 2000, pois a exposição dos investidores locais à ativos privados ainda tÃmida não era um campo fértil para secundários. Os investimentos em ativos alternativos dos institucionais e das famÃlias ganharam força a partir de 2006 e atingiram o pico em 2012. Entretanto, a partir de 2015 com a perspectiva negativa da economia brasileira o mercado secundário passou a se desenvolver. Na Spectra, chamávamos as primeiras transações de pacote Miami: Brasileiros com medo do recrudescimento da crise, se mudando para o exterior e vendendo seus ativos no Brasil. Na esteira deste movimento, surgiu o interesse de fundos de pensão para buscar liquidez para seus portfolios remanescentes de investimentos em Private Equity e Infraestrutura.
O movimento dos fundos de pensão merece um parágrafo a parte. O investimento em Fundos de Investimentos em Participações (FIPs) é ainda um assunto amargo para algumas das maiores fundações do paÃs. Os malfeitos do passado deixaram profundas chagas e levaram o órgão fiscalizador (PREVIC) a apertar a regulação fazendo com que muitos fundos de pensão repensassem sua estratégia para a classe de ativos, tanto para novos investimentos como para a própria exposição existente. As fundações passaram a conviver com um grande volume de exigências e questionamentos, principalmente nos casos em que tinham assento no comitê de investimentos dos FIPs e aprovavam as operações propostas pelos gestores, o que acreditamos ser uma incompatibilidade com o modelo de investimento em ativos alternativos. O aumento das exigências do regulador e os portfólios maduros e muitas vezes pouco representativos vis-à -vis ao seu patrimônio provocaram os fundos de pensão a considerar a venda de suas participações no mercado secundário. Algumas das principais fundações já concluÃram processos de venda no mercado secundário e outras buscam esta solução.
A Spectra realizou 75 aquisições no mercado secundário no Brasil desde 2014 e é o principal gestor em número e volume de transações.A opção de venda dessas posições é justificada pelo demasiado tempo que o correto monitoramento demanda da equipe de investimentos, em muitos casos é desproporcional ao benefÃcio de mantê-las. Além disso, o capital e o tempo da equipe podem ser realocados em novas posições na estratégia de ativos privados ou em outras estratégias de investimento, o que ajudaria a explicar este movimento.
Fundos que excederam o prazo de duração e buscam sucessivas extensões geram conflitos entre investidores e gestores. Geralmente os ativos remanescentes têm baixa perspectiva de venda no curto prazo. Além dos ativos que não foram vendidos, alguns fundos acumulam créditos jurÃdicos, que normalmente não estão nas principais competências dos gestores para que possam encaminhar as melhores soluções.
A existência do mercado secundário traz conforto aos investidores para investir na classe de ativos, pois permite a saÃda antecipada de posições indesejadas pelas razões expostas acima, constituindo uma importante caracterÃstica de mercados desenvolvidos de ativos privados. Gestoras especializadas cumprem esse papel e, como observado nos mercados internacionais, tendem a crescer ainda mais no Brasil. Espera-se que as alocações de famÃlias e investidores institucionais continuem crescendo em uma classe de ativos que demonstra ano após ano a sua capacidade de agregar rentabilidade aos portfólios, deixando os fantasmas do passado para trás.
Renato Abissamra é sócio da Spectra Investimentos