Edição 372
A elaboração da política de investimentos, realizada anualmente, representa um grande desafio para os fundos de pensão, especialmente para aqueles que operam com planos de benefício definido, que, na maioria dos casos, já se encontram na fase de concessão de benefícios. Neste ano, as dificuldades enfrentadas são ainda mais intensas em virtude da conjuntura política e econômica que se apresenta tanto no cenário internacional quanto no nacional.
Atualmente, o panorama global é marcado por uma complexidade que dificulta a previsão de resultados, em especial, pela economia americana que demonstra sinais de robustez, mas a inflação continua a ser uma preocupação persistente, e o arrefecimento demonstrado pela economia da China ainda impactada pela prolongada crise do setor imobiliário e o consumo débil.
No contexto brasileiro, embora o mercado de trabalho e a produção nacional apresentem sinais de expansão e otimismo, a inflação – tanto a atual quanto as projeções para os próximos anos – voltou a acelerar, levando o Banco Central a aumentar a taxa básica de juros, agravada também pela política fiscal expansionista, resultando em impactos diretos no mercado financeiro, como o aumento das taxas de juros futuras e uma queda acentuada na bolsa de valores.
Nesse cenário desafiador, as alocações de recursos dos fundos de pensão devem levar em consideração essas variáveis em seus modelos de Gestão de Ativos e Passivos (A&LM). As premissas que envolvem risco e retorno são cruciais para a formulação da estratégia que será aprovada nas diretrizes da política de investimentos.
No segmento de renda fixa, surgem oportunidades atrativas em títulos públicos federais (TPF), que apresentam diferentes indexadores prefixados e pós-fixados. Para as obrigações previdenciárias de “Benefícios Concedidos”, a imunização do passivo por meio da aquisição de TPF indexados à inflação (NTN-B) é uma abordagem recomendada. Essa estratégia é ideal por permitir o casamento de fluxos financeiros, dada a alta correlação entre os índices de correção, além de reduzir o risco de mercado.
Por outro lado, a parcela de ativos que são “marcados a mercado” tende a sofrer os efeitos da flutuação das taxas de juros, aumentando o risco de mercado. Há também a deterioração do risco de crédito dos títulos privados com a reclassificação de seus ratings. A alocação em títulos privados com prazos mais longos deve ser monitorada com cautela, devido à baixa liquidez observada no mercado secundário e os spreads compatíveis com o risco embutido.
No segmento de renda variável, as incertezas são consideráveis, uma vez que o cenário tem sido fortemente impactado pela deterioração da política fiscal do país e pelo aumento da taxa Selic, que tende a elevar os custos de alavancagem das empresas. Em decorrência disso, a alocação deve ser mantida a um nível baixo nos próximos anos, ou até que o Brasil recupere o status de “Investment Grade”.
Os investimentos no exterior têm demonstrado um desempenho notável nos últimos tempos e boas perspectivas futuras. Essa estratégia possibilita a alocação em setores da economia, como Inteligência Artificial e Tecnologia da Informação, que não estão disponíveis no mercado acionário nacional, além do benefício da diversificação em virtude da descorrelação com os ativos domésticos.
Ademais, outros ativos alternativos disponíveis no mercado, como operações estruturadas, securitizações e fundos de participações, ainda são considerados opções incipientes e necessitam de um maior dinamismo no mercado, além de estudos mais aprofundados.
Como elemento de relação entre os ativos e passivos, a taxa de juros real adotada para os cálculos atuariais deve estar alinhada à meta de retorno e ao risco que a carteira de investimentos pode suportar.
Em resumo, é possível perceber que os desafios enfrentados por essas entidades são significativos, especialmente considerando a atual conjuntura e os cenários prospectivos repletos de incerteza. Contudo, a existência de um mercado robusto de títulos de renda fixa pode proporcionar um alívio considerável e gerar resultados que sejam compatíveis com as necessidades atuariais. Isso depende, fundamentalmente, do estabelecimento de políticas de investimentos que sejam fundamentadas em cenários econômicos coerentes, além da adoção de modelos de alocação que atendam aos níveis de risco suportável, às expectativas de retorno e aos prazos exigidos.
Carlos Alberto Zachert é consultor de fusões e aquisições e ex-diretor de investimentos do Postalis