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A barreira dos juros altos
Juros altos ainda são a principal barreira para que as entidade de previdência fechada voltem a fazer investimentos no setor

Edição 372

Kuhnen,Sulyvan(Previcel) 18marUma combinação de taxas de juros elevadas, com a Selic cobrindo com folga o atuarial dos fundos de pensão, e marcas de um passado recente onde operações da Polícia Federal, notadamente a Greenfield, difundiram supostos esquemas de corrupção em fundos de private equity investidos por fundações, praticamente retiraram essa classe de ativos do radar das entidades fechadas de previdência complementar.
Junte-se a isso um desempenho medíocre que tiveram nos primeiros anos do milênio, que mesmo melhorando nos seguintes não apagou a impressão anterior. Segundo estudos da empresa Private Equity Bay (Pebay), os fundos de private equity e venture capital (PE/VC) com participação de fundos de pensão tiveram resultados muito ruins entre 2002 e 2013 (com exceção de 2009), chegando a ser negativos em cinco destes anos. Se recuperaram entre 2014 e 2021, com retornos anuais na casa de dois dígitos (com exceção de 2019), mas as taxas de juros elevadas e a memória relacionada a supostos esquemas de corrupção investigados pela Polícia Federal colocou os PE/VC na geladeira dos fundos de pensão durante os últimos dez anos.
“É uma questão muito delicada, especialmente para fundos que tiveram prejuízos com esses ativos. Precisam repensar mesmo. Tendo outras oportunidades, é melhor partir para elas. Claro, é necessária a diversificação, mas quando você lida com patrimônio de milhares de famílias, é complicado ter um revés. Precisamos prezar pela segurança nos investimentos”, considera Sulyvan Truppel Kuhnen, diretor administrativo e financeiro da Previcel, o fundo de pensão da empresa de papel e celulose Celepar.

Juros fala mais alto - Uma das poucas entidades que resolveu se arriscar com alocações em private equity nos últimos anos foi a Previcel, que investiu cerca de R$ 900 mil num fundo de PE/VC da Vinci Partners em 2021. Em meio à pandemia da Covid-19, com a taxa de juros baixa e a necessidade de exposição ao risco, um estudo contratado pela fundação incentivou o investimento no setor.
O montante foi baixo, considerando os cerca de R$ 500 milhões de patrimônio da Previcel. O investimento ainda está em fase de captação, e o valor total desembolsado pela fundação paranaense chegará a R$ 1,5 milhão, representando 0,3% do total do patrimônio.
Kuhnen explica que a opção por um investimento pequeno no setor está ligada à cautela e à mudança do cenário macroeconômico nos últimos três anos. “Na época (2021), os estudos indicavam a necessidade de exposição a risco, para diversificar a carteira. Mas logo o jogo virou, a taxa de juros subiu e, por isso, pisamos no freio.”
O dirigente destaca que o fundo de private equity em que a Previcel está alocada investe em seis empresas e tem duração total prevista de oito anos. No momento, a entidade não tem planos de voltar a investir no setor, principalmente pela atratividade das taxas de juros. “A gestão de patrimônio de uma EFPC precisa levar em consideração o risco e o retorno. Hoje, você pode fazer alocações com muito menos risco e com retornos aceitáveis para a necessidade atuarial, então, é natural evitar o risco. Sem contar que muitos FIPs tiveram problemas financeiros, isso foi divulgado pela mídia”, diz o dirigente.
“Caso os juros caiam, acho um caminho natural as entidades voltarem para o risco, mas de forma gradativa. Primeiro, vão voltar para os multimercados estruturados, depois para renda variável. Em seguida talvez aumentem investimento no exterior, para só depois pensarem em produtos mais estruturados. Acho que vai demorar um tempo considerável para voltarem ao patamar de risco dos FIPs”, analisa.

Ribeiro,Bruno(E Invest) 24set 03(BrunaNishihata)Visão pragmática - Outra entidade que interrompeu as aplicações em private equity é a E-Invest. A fundação patrocinada pela Ericsson possui em sua carteira 14 fundos de investimento em participações (FIPs), dos quais três são classificados como private equity e um como venture capital. Dos outros dez, quatro são florestais, três são de infraestrutura, dois são imobiliários, um de logística. E por mais que estejam performando de acordo com o esperado, a decisão é não retomar alocações neste tipo de ativo no momento.
O superintendente da E-Invest, Bruno Ribeiro, explica que a decisão de se distanciar desses ativos tem a ver com o cenário macroeconômico. “Precisamos pensar na liquidez dos planos, no momento que atravessamos, com taxa de juros mais altas. Os investimentos precisam ter risco/retorno adequado a essa realidade. Mas quando a taxa de juros cair vamos retomar esses investimentos”, afirma.
Os quatro fundos de private equity e venture capital que contam com participação da E-Invest são o Spectra IV, o Spectra V, o BTG/Signal II e o Invest Tech VC, nos quais está investido, no total, 1,75% dos cerca de R$ 2 bilhões de patrimônio da entidade. As Taxas Internas de Retorno (TIR) desses fundos, até o fim de novembro, eram de 26,3%, 18,9%, 8,4% e 21,6%, respectivamente.
Ribeiro aponta ainda que, o principal desafio do investimento em private equity é o monitoramento. “Não é trivial e não é qualquer consultoria que faz. Uma entidade menor, como a nossa, precisa de ajuda. Temos uma consultoria especializada que realiza esse monitoramento empresa por empresa, com relatórios semestrais sobre resultados, crescimentos, atuação dos gestores, entre outros pontos”, diz.

Lakoski,JoseCarlos(Copel) 24fevPlanejamento é essencial - Com um total de 27 FIPs em sua carteira de investimentos ilíquidos, dos quais seis são florestais, cinco de infraestrutura e 16 de private equity, a Fundação Copel pretende ampliar o atual patamar que atualmente soma R$ 850 milhões, representando cerca de 5,8% do patrimônio da entidade, que atinge hoje R$ 14,5 bilhões.
“Iniciamos a construção do nosso planejamento nessa classe de investimentos ilíquidos em 2012. Tivemos muita disciplina ao longo desses anos, afinal sabemos da dificuldade na busca por dados sobre os ativos. Mesmo assim, consideramos que era possível montar uma carteira de ilíquidos com conceitos básicos de formação de portfólio”, comenta o diretor de investimentos da Copel, José Carlos Lakoski.
As alocações da fundação em private equity estão distribuídas em fundos da Spectra, BTG Pactual, Kinea, Treecorp, Pátria e Vinci Partners. E, ao contrário de E-Invest e da Previcel, a Fundação Copel tem em seu planejamento nova aplicações neste tipo de investimento.
“Temos um programa criado há anos, muito maduro, e confiamos nele”, relata Lakoski. “Inclusive, já tivemos desinvestimento em alguns fundos. Então, precisamos voltar a investir cerca de R$ 120 milhões a R$ 130 milhões para seguir no mesmo nível de alocações em private equity. Nosso programa prevê a manutenção deste nível.”
O diretor lembra que a Copel também sofreu com perdas no setor, especialmente nos primeiros anos de investimentos, mas vê justamente na resiliência uma característica fundamental para ter sucesso com private equity. Além, claro, de estudo e monitoramento para encontrar as melhores opções em um mercado menos explorado por entidades previdenciárias.
“Se a taxa de juros for uma variável predominante em uma entidade, então é melhor nem entrar em private equity. Você precisa entrar independentemente da taxa de juros e estar seguro para investir em todos os ciclos econômicos, não tem como adivinhar se eles serão positivos ou negativos a longo prazo. Então, é necessário investir todos os anos, para estar em todos os ciclos”, recomenda.
Lakoski concorda que se trata de um ativo especialmente arriscado, mas avalia que a maior parte dos riscos podem ser mitigados nas ações prévias ao investimento. “É na fase de prospecção, de análise e de contratação que você pode mitigar esses riscos, através de análises criteriosas. É preciso trabalho de equipe, de gestor, entender a tese, ver o pipeline das empresas, a performance anterior. E depois que contrata você precisa sair da operação. Se já ‘deu o cheque’, definiu o mandato, não dá para interferir. Mas, lógico, tem que acompanhar, monitorar os riscos”, encerra