Edição 372
O setor de entidades fechadas de previdência complementar (EFPC) foi surpreendido na primeira semana de dezembro com uma proposta de Instrução Normativa do Tribunal de Contas da União (TCU) de fiscalizar diretamente as EFPCs, sem precisar transitar pelos canais da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc).
A proposta foi elaborada pelos ministros do TCU Antonio Anastasia, Vital do Rêgo e Jorge de Oliveira e esteve aberta por 15 dias durante o mês de novembro para que outras instâncias do Ministério Público (MP) pudessem fazer contribuições. O período foi encerrado ao final do mês mas a proposta não foi pautada para votação na última reunião do ano do TCU, ocorrida em 4 de dezembro, que elegeu o novo presidente do órgão, o ministro Vital do Rego Filho. Ele substituiu o ministro Bruno Dantas e deve pautar o tema para votação em 2025.
O texto da proposta elaborada pelo trio de ministros do TCU esclarece as intenções do órgão, ao considerar que o mesmo “detém objetivos institucionais que diferem substancialmente daqueles conferidos aos órgãos supervisores e, algumas vezes, com eles se antagonizam”.
“Imagina-se a hipótese da aprovação de um plano de equacionamento de déficit de uma EFPC patrocinado por uma empresa estatal em que houvesse uma superestimativa do déficit atuarial. A Previc, ponderando que o equacionamento melhora a higidez do plano de benefícios, muito provavelmente não se oporia ao plano. O TCU, de forma contrária, ao aferir que o déficit superestimado oneraria indevidamente a União, tenderia a impugnar o plano”, afirma.
De acordo com o advogado e sócio do escritório Bocater Camargo e Associados, Flávio Martins Rodrigues, a proposição do TCU é “inadequada”, uma vez que “parte do pressuposto de que as EFPCs, por receberem aportes de patrocinadores estatais, possuem recursos públicos”. “Uma vez que esses recursos chegam às entidades, eles passam a ser destinados aos participantes, que são pessoas privadas, portanto, deixam de ser públicos”, argumenta.
Thiago Cardoso Araújo, advogado do mesmo escritório, vai além e aponta que a proposta, se aprovada, representaria uma alteração na forma de atuação do tribunal diante do sistema previdenciário. Segundo ele, a fiscalização das EFPCs de patrocinadores públicos acontece apenas após o TCU discordar de uma decisão da Previc relativa a determinada entidade.
“Antes, havia processos nascidos de forma extraordinária, vindos de representações, denúncias, e o TCU ia atrás dessas supostas irregularidades dos fundos de pensão. Caso haja aprovação, ele passaria a ter um monitoramento contínuo, não mais uma coisa meramente pontual”, analisa.
Associações reagem - A proposta também gerou repercussão entre as associações do setor, que rapidamente se manifestaram contrariamente ao texto. Presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), Jarbas de Biagi defende que “as fundações devem ter suas atividades fiscalizadas pela Previc, que é a autarquia com competência legal para exercer essa atividade”.
O dirigente aponta, ainda, que a aprovação da proposta pode trazer insegurança jurídica para o setor, uma vez que uma mesma questão pode ter entendimentos e julgamentos diferentes pela Previc e o TCU. E afirma que “uma dupla fiscalização traria um ônus desnecessário para o erário”.
Análise semelhante faz o presidente da Apep, Herbert de Souza, que destaca a competência da Previc para realizar a fiscalização das ações das EFPCs e a preocupação em relação a “uma possível e futura interferência juntos aos patrocinadores privados que tenham planos em EFPCs públicas”.
“A Previc é o órgão federal que detém a competência técnica e legal para exercer essa fiscalização. Ao nosso ver, uma dupla fiscalização somente traria mais custos ao erário público, e também às entidades, quando o próprio governo e as entidades buscam, em conjunto, reduzir o excesso de burocracia do setor como um todo”, comenta.