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CEO do Standard Bank defende mais parcerias entre Brasil e África

Natalia DiasStandardBankCom uma população de 1,3 bilhão de pessoas, que deve dobrar até 2050, a África é um continente com grandes oportunidades de negócios para as empresas brasileiras, principalmente dos setores agrícola e de energia, defende a CEO do Standard Bank Brasil, Natália Dias. “Minha missão é desmistificar a África e mostrar que existem grandes possibilidades de parceria com empresas brasileiras”, diz ela que há onze anos dirige o banco sul-africano no Brasil. “O mundo todo já acordou para a África, a China tem investido pesadamente no continente, o Brasil está até um pouco atrasado nessa corrida”.
Sediado na África do Sul, em Johanesburgo, o Standard Bank é o maior banco do continente africano, com US$ 170 bilhões em ativos e US$ 17 bilhões em capitalização de mercado. Até 2015 o banco operava como um banco de investimento no Brasil, assim como nos outros países que formam os BRICs (Rússia, Índia e China), mas o conjunto dessas operações, que demandavam 30% do capital alocado, geravam apenas 5% do resultado total do banco. “A direção optou por transformar essas operações em representações comerciais e concentrar as alocações de capital nos países do continente africano, onde sempre fomos um player dominante e estávamos perdendo market-share”, explica Natália.
Em entrevista à Investidor Institucional, ela diz que está numa cruzada para desmistificar a África para as empresas brasileiras. Recentemente fez uma apresentação à convidados do Instituto San Thiago Dantas de Direito e Economia, que tem organizado palestras online com executivos e diplomatas com atuação no continente africano para discutir novas abordagens em relação à região. “A África é hoje a maior fronteira de alto crescimento do mundo”, explica Natália.

Crescimento - Segundo ela, a região é a que mais cresce no globo depois da Ásia. Nos últimos vinte anos, até 2020, a média de crescimento da África foi de 4,05% ao ano, atrás apenas da Ásia que cresceu 4,86% ao ano no mesmo período, mas bem acima da média mundial, que ficou em 2,8% anuais. Em 2020, com a pandemia da Covid-19, pela primeira vez em 50 anos o continente teve queda no seu Produto Interno Bruto, decrescendo -2,6%. Mas voltou a subir em 2021, registrando alta de 3,21%. “Nas nossas projeções, nenhum país da região crescerá a taxas inferiores a 2% nos próximos anos”, diz Natália.
Além disso, com uma população cuja média de idade é de 19,7 anos, o continente usufrui de um bônus demográfico que a maioria das outras regiões do mundo, com populações mais envelhecidas, já perdeu. Paralelamente, embora tenha ainda um PIB per capita baixo em relação a outras regiões do mundo, a renda da população africana vem crescendo num ritmo forte. Prova disso é a relação de um consumo familiar aumentando em 3,4% ao ano frente a uma população que cresce 2% ao ano, o que aponta para a emergência de uma classe média na região. Além disso, segundo Natália, é a área do mundo que mais conecta pessoas à internet e às novas tecnologias bancárias.

Parcerias - Ela avalia existir um potencial de negócios com empresas brasileiras da área agrícola, em primeiro lugar. A savana africana possui clima e solo com características muito semelhantes às do cerrado brasileiro, mas tem uma produtividade muito inferior, o que abre espaços para parcerias com companhias brasileiras que vão desde transferências de tecnologia e venda de maquinários agrícolas, num primeiro momento, até a montagem de centros de pesquisa agrícolas e cultivo de áreas diretamente, num segundo momento. A China tem tentado preencher esse espaço, oferecendo desde maquinários agrícolas mais modernas e baratas até financiamentos, fomentando a agricultura africana para contar com um fornecedor de alimentos mais próximo e mais dependente.
Outro segmento com grande potencial de negócios para empresas brasileiras é na área energética, principalmente na área de biocombustíveis. Embora tenha um potencial na produção de cana de açúcar e milho, a África não possui o know-how brasileiro para o emprego desses cultivares em usinas de etanol de uso automotivo. Além de ajudar na construção de plantas de etanol, as parcerias brasileiras poderiam avançar transferindo tecnologia para a mistura do etanol à gasolina africana e adaptando veículos a gasolina para etanol, ou flex, no continente. Com a África do Sul, que possui uma indústria automobilística já avançada e muito similar à brasileira, poderia haver cooperação para carros flex. “Há toda uma cadeia de valor a ser explorada nessa direção”, aponta Natália. Ainda na área energética, a CEO do Standard Bank Brasil aponta possíveis parcerias na implementação de usinas de energia, principalmente eólica e solar, num continente que vive uma fase de transição energética vindo do carvão para fontes mais limpas. “Hoje, 80% da energia da África ainda vem do carvão”, diz.

Transição energética - Segundo ela, embora esteja chegando tarde ao mercado de consumo, a África não vai repetir a trajetória dos países desenvolvidos. “Vai passar diretamente do carvão para energias limpas, como a eólica e a solar”, diz. Natália conta que a África, embora seja responsável por apenas 2% das emissões de gases de efeito estufa, está saltando etapas para processos de produção que levam em conta fatores ESG (de Ambiental, Social e Governança, na sigla em inglês). O Standard Bank, segundo ela, tem financiado importantes projetos nessa área. Ela também vê potencial na área de projetos sociais, como os de habitação popular na Nigéria, que o Standard Bank financia.
Segundo ela, o Brasil possui um “soft power” de grande valor no continente africano e que é pouco explorado. Ele vem da atuação das empresas brasileiras, das áreas de construção civil e petróleo, principalmente, que atuaram na região na primeira década deste século. “Deixaram uma imagem muito positiva”, diz Natália. Ela ilustra com uma história sobre uma fabricante brasileira de equipamentos que fornecia para um cliente africano. A brasileira perdeu o cliente para um fornecedor chinês, cujos produtos eram baratos e com mais tecnologia. Mas, depois de algum tempo comprando do fornecedor chinês, o cliente africano voltou a procurar a fornecedora brasileira. “Apesar de menos tecnológicos, os produtos brasileiros eram mais adaptados às condições africanas”, explica Natália. “E o “soft power” do Brasil também contou bastante para essa recuperação”.