Edição 369
Magadar Briguet é uma advogada que conhece como poucos a área de previdência de servidores. Procuradora aposentada do município de São Paulo, ela costuma dizer que iniciou suas atividades como consultora de regimes próprios de previdência social (RPPS) quase por acaso, quando foi promulgada a Emenda Constitucional nº 20, em 1998, que estabeleceu idades mínimas de aposentadoria para servidores públicos e também definiu as regras de criação dos RPPS.
“Como procuradora, eu tive muita experiência relacionada ao regime jurídico dos servidores, então quando veio a Emenda 20 foi um passo para eu ser demandada pela área de previdência de servidor. Eu acabei participando de toda a legislação produzida pela prefeitura para essa área”, explica. Alguns anos mais tarde, por conta dessa experiência acumulada, ela tornou-se consultora jurídica da Apeprem, a entidade dos regimes próprios paulistas, e também sócia, atualmente, da consultoria ABCPrev.
Um dos temas que tem chamado sua atenção ultimamente é a discursão à respeito da reoneração da folha de pagamentos dos municípios pertencentes ao regime geral com população de até 156,2 mil habitantes. Esses municípios tiveram a alíquota do INSS rebaixada de 20% para 8% pela Lei nº. 14.784, de dezembro do ano passado, mas em meados de agosto último o Senado estabeleceu uma escadinha para elevar gradualmente o imposto desses municípios para 12% em 2025, 16% em 2026 e 20% em 2027.
Foi a resposta do Senado tanto aos apelos do Ministério da Fazenda, que reclamava não ter como arcar com tal queda da receita, quanto aos apelos dos dirigentes de associações de RPPS, que temiam uma migração em massa de municípios abrigados no regime próprio para o regime geral, em razão das atraentes alíquotas de 8% aprovadas no final do ano passado para serem permanentes.
“A reoneração já está aprovada no Senado, mas de qualquer forma não acredito que haveria migração massiva”, diz Briguet. “O raciocínio do prefeito é simplista, ele pensa: nossa, eu migro e acabam todas as minhas obrigações e eu só vou pagar 8%. Mas não é bem assim. Quando ele examina com cuidado as implicações de uma migração para o regime geral, essa deixaria de ser tão atraente”.
Segundo Briguet, na migração as prefeituras não se livram das aposentadorias dos servidores transferidos ao INSS. Elas precisam manter os fundos de previdência que tinham no regime próprio e aplicar os recursos no mercado financeiro conforme as regras de investimento do setor, para entregar os recursos ao INSS quando o servidor se aposentar. “Não é um dinheiro livre, é um dinheiro vinculado. E vinculado a que? À construção das aposentadorias”.
Em todo caso, a decisão do Senado, que ainda precisa ser referendada pelo Congresso, torna agora pouco atrativa a migração, uma vez que a alíquota de 8% do INSS vai vigorar apenas até o final deste ano. “Até pode ter algum município que ainda queira mudar, mas acho difícil”, pontua.
Outro tema sobre o qual é bastante crítica é em relação à exclusão de servidores de estados e municípios das regras da reforma previdenciária de 2019. As regras da Emenda Constitucional 103 só valem para trabalhadores da iniciativa privada e servidores da União. Estados e municípios precisam aprovar regras próprias junto aos seus legislativos.
A EC 103 estabelece apenas que entes federativos com RPPS e que tenham servidores ganhando acima do teto do INSS, devem aprovar, em até dois anos, legislações próprias para criar os Regimes de Previdência Complementar (RPC). Levantamento recente realizado pela Secretaria de Regime Próprio e Complementar (SRPC) mostra que dos 2.140 entes federativos obrigados por força da EC 103 a criar RPC para seus servidores, 1.975 (92%) já aprovaram leis nesse sentido e 794 (40%) já conseguiram da Previc autorização para funcionamento.
“Mas há municípios que criaram os RPCs e quase não tem ninguém nele. Instituiu e ponto. E instituiu por quê? Porque a lei obriga, mas como o município não está contratando ninguém desde 2021 os RPC estão vazios”, pondera. Segundo ela, as regras da EC 103 deveria valer tanto para servidores da União quanto de estados e municípios, assim esses últimos não teriam que aprovar regras próprias. “Imagine mais de 2 mil regras diferentes, uma loucura”, diz.