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É preciso pensar nos futuros participantes dos planos, diz Buosi

Maria Eugênia BuosiResultanteKPMGEnquanto parte do mercado financeiro ainda discute se os investimentos sustentáveis podem (ou não) resultar em menores rentabilidades de curto prazo, a futura geração de participantes dos planos de previdência complementar, hoje ainda adolescente, tem um outro ponto de vista sobre a questão, avisa Maria Eugênia Buosi, diretora da Resultante KPMG, consultoria especializada no tema. “Os jovens questionam até quando será possível continuar com o pé no acelerador do atual modelo de produção, que está errado, sem que as consequências recaiam sobre o futuro econômico deles”, afirma.
Buosi, que participou de painel sobre o tema dos investimentos ESG no Fórum Perspectivas Brasil 2023 realizado pela revista Investidor Institucional na última quinta-feira (27/4), diz que os gestores das fundações precisam perceber que a próxima geração de participantes chega ao mercado “com um chip diferente do nosso”. Serão investidores conscientes de que pensar na perenidade dos negócios é essencial para os resultados da alocação.
Outro aspecto que ainda cria alguma resistência é o do eventual custo imposto pela adoção dos princípios ESG. “Mas o que ocorre, na verdade, é uma internalização de custos que foram externalizados pelas empresas durante décadas, um processo pelo qual pagamos um alto preço (na forma de degradação ambiental). Chegamos hoje a um ponto de inflexão em que o custo de não fazer nada é muito mais elevado do que o de fazer, e isso já aparece nos seus resultados”, diz.
Ela cita o desastre da Vale com as suas minas em Minas Gerais, por exemplo, que atingiu em cheio os ativos triple A da companhia presentes nas carteiras de muitos fundos de pensão, ou seja, um fator ambiental impactando o risco de crédito. Buosi ressalta a importância dos investimentos que financiam a nova indústria de carbono zero e afirma que havia, até há pouco tempo, uma dissociação entre a agenda ESG e o mundo dos negócios, defendendo que o ESG pode integrar todas as classes de ativos.
Embora isso seja mais visível em carteiras de renda variável e de crédito privado, o mercado de títulos públicos também pode integrar esses princípios por meio da análise de sustentabilidade das políticas públicas e seu impacto para reduzir o risco-país em vários aspectos macroeconômicos.
Não faltam dificuldades, porém. “Não estamos no ponto em que poderíamos estar e ainda é difícil discutir a descarbonização dos portfolios, falta disposição de muita gente para ouvir e entender o assunto. Além disso, é difícil ainda falar sobre mais diversidade e inclusão, temas que às vezes esbarram em questões pessoais”, afirma a executiva.
Segundo ela, também falta informação organizada e comparável nos relatórios das companhias, o que dificulta comparar dados de empresas do mesmo setor. “Às vezes essa dificuldade aparece até mesmo nos relatórios da própria empresa ao longo de cinco anos porque não há qualquer comparabilidade”, diz. A expectativa é de que venha uma padronização, com a inclusão pela CVM de parâmetros nos formulários de referência.

Gilmar WanderleyPreviEstratégia central - Na avaliação de Gilmar Wanderley, gerente de mercado de capitais da Previ e que também palestrou no Fórum da Investidor Institucional, a forte governança interna da entidade tem sido um fator fundamental para o avanço do trabalho feito pela entidade em relação aos princípios ASGI (responsabilidade ambiental, social, de governança e integridade). Com R$ 250 bilhões sob gestão, ou 22,5% dos ativos de todos os fundos de pensão brasileiros, a Previ considera, segundo Wanderley, que “a sustentabilidade tem que estar no centro de sua estratégia porque a previdência tem que ser perene”.
Wanderley observou que aspectos intangíveis podem impactar os ativos de equities e de crédito e fez uma provocação às companhias para que elas revejam seus modelos de negócios. “A maior parte do valor da companhia está em sua perpetuidade, tanto em relação aos riscos como às oportunidades de ganhos”, afirmou.
Para ele, a principal dificuldade para que os investimentos sustentáveis cresçam no mercado brasileiro está mesmo na qualidade das informações prestadas aos investidores pelas companhias. “Os departamentos de RI muitas vezes não sabem responder ao que perguntamos”, afirmou. Wanderley também ressaltou a atual concentração das carteiras das EFPCs em títulos públicos. “Talvez fosse importante discutirmos a criação de perfis de investimento específicos para os ativos ESG”, sugere.
Primeira fundação da América Latina a ser signatária do PRI (Principles for Responsible Investments), a Previ seleciona ativos a partir de um rating ASGI feito com metodologia proprietária (análises quantitativa e qualitativa definem a visão do portfólio). “O rating dá o endereçamento do assunto que será feito por meio da política de investimentos e funciona como insumo para a construção da carteira ativa de renda variável”, informa.
Ele cita ainda o encontro anual de governança organizado pela entidade e seu inventário de emissões, com metas para cumprir o compromisso net-zero de redução de emissões de carbono. “Inauguramos no início de 2022 uma usina fotovoltaica que reduzirá o volume de emissões”, explica referindo-se à usina instalada em Nova Iguaçu (RJ) e que fornece energia elétrica à sede da entidade a partir da geração de energia solar. O contrato tem duração de 15 anos e prevê uma economia da ordem de 27% em relação ao valor pago à concessionária local de energia elétrica, a Light.
O engajamento junto às companhias investidas é outro aspecto relevante dos esforços ASGI, afirma Wanderley. Isso é feito via posicionamento em assembléias, por meio da atuação da entidade como acionista ativa e de uma série de ações colaborativas de engajamento.
Pedro_VilelaRiseVenture.jpgA Previ é uma das poucas EFPC brasileiras que têm porte para ter uma ação mais contundente nesse mercado, admite Wanderley, mas ele avalia que “todos os fundos de pensão, independentemente de seu tamanho, podem ir galgando degraus ASGI aos poucos”.

Greenwashing - Para Pedro Vilela, co-fundador e CEO da gestora Rise Ventures, que atuou como mediador no painel, os números divulgados globalmente e que dão conta de US$ 53 trilhões (um terço dos ativos globais) a serem investidos em ESG até 2025, precisam ser vistos com uma forte desconto. “Boa parte disso é greenwashing e 85% desses recursos estão concentrados nos EUA e na Europa. No Brasil, fala-se muito de sustentabilidade, mas pouco se faz”, ressalta.
Ele lembra que as empresas seguem perdendo valor por questões de governança, ao mesmo tempo em que aumenta o peso das questões ambientais e sociais, com impacto sobre o valuation das companhias. “Vale perguntar: porque o Brasil está atrasado nisso?”, questiona. Ele avalia que será necessário passar por uma etapa de educação sobre os aspectos morais e econômicos do assunto. Mas vê uma tendência de fortalecimento do tema junto aos investidores institucionais. "As EFPCs deverão sofisticar cada vez mais esse tipo de investimento em suas carteiras e um dos pontos principais é saber como aumentar a sofisticação técnica dos alocadores", afirma.