Artigo de Isabel Lemos *
O atual momento é propício para falar do mercado de equities no Brasil, que parece ter sido “esquecido pelos investidores” nos últimos anos - pelo menos no que tange a alocações. Sem dúvida nenhuma, quem tem exposição, não esqueceu em nenhum minuto do mercado. Certamente esse assunto foi motivo de conversas infindáveis para tentar entender o que acontecia e especular quando poderíamos ver uma retomada nos preços das ações.
Movimentações recentes foram alternativas para o aumento de exposição em mercados de renda fixa, crédito, imobiliário entre outros, devido principalmente a incertezas globais e perspectivas de alta de juros. Hoje podemos olhar pelo retrovisor, mas isso é difícil quando estamos em voo em plena turbulência. E agora, será que esta turbulência parou?
Um dos principais questionamentos é: como argumentar para investidores mais conservadores e até moderados, uma tese de alocação em renda variável quando os juros longos, NTN-b estavam em patamares atrativos e subindo?
Conflito (Rússia e Ucrânia), inflação, pandemia e juros, foram alguns dos fatores que geraram este desconforto com o mercado de renda variável e fizeram com que grande parte dos ativos mais voltados à economia doméstica tivessem quedas significativas. Vamos aos fatos: ativos em um período de 1 ano chegaram a cair 70-90%. Número impactante. Como explicar que um ativo que valia 100 reais chegou a valer ou vale 10-30 reais? De uma maneira simplista e fundamentalista, poderíamos ter algumas explicações: a) com juros mais alto o valor presente do fluxo de caixa é menor; b) risco de queda significativa na geração de caixa por vários anos; c) risco de solvência da empresa e por fim; d) trade custo-benefício.
Cada investidor reagiu e reage à turbulência olhando o que entende ser melhor naquele momento. Muitos olhando o fundamento, assumindo que o cenário estava incerto e que a geração de caixa ficaria baixa por mais tempo, outros simplesmente preferem ir para ativos sem risco, pois acreditam que naquele momento o custo-benefício de se manter com renda variável não era interessante.
Gosto de olhar este tema e imaginar que muitas vezes, inconscientemente ou não, tomamos decisões pensando em uma balança com dois pratos, no qual vou nomear: “balança pragmática fundamentalista emocional”. Vamos, de forma simples, olhar onde está a tendência e escolher onde ficar. Imagine que a cada variável negativa colocamos 1 kg no prato da direita e a cada variável positiva colocamos 1 kg no prato da esquerda. Apesar de simples, o dom é saber quando parar de apostar no prato direito e ir para o prato esquerdo. Quem sabe até antecipar o movimento da balança, pois isto te dará um melhor retorno.
Somos humanos, se por um lado queremos ser pragmáticos, por outro temos medos, ansiedades. Queremos ser fundamentalistas, olhar o futuro, olhar a geração de caixa da empresa, mas as incertezas e passados recentes sempre nos deixam mais cautelosos. Ou seja, nosso emocional sempre interfere de uma forma ou de outra na resposta. No fim, procuramos sempre maximizar os ganhos e minimizar os riscos, levando em consideração que cada indivíduo tem seu tempo, sua adaptação e por isso, o mercado vai se movimentando em diversas direções procurando a eficiência.
Esta é a maravilha do mercado, que muitos questionam ser ou não eficiente. Para Adam Smith, se a economia fosse livre, sem intervenções, o auto interesse levaria de forma mais rápida uma nação a alcançar o progresso e o crescimento econômico. O “obstáculo” para esta eficiência seria o intervencionismo, no caso, do Estado. A “mão invisível” de Adam Smith estaria automaticamente ajustando seus preços conforme necessidade do mercado.
Diferente do que Smith pregava, o governo em alguns momentos faz intervenções e com isto destorcem os preços. Mas o fato é que o mercado reage a diversas variáveis, sendo estas controladas pelo Estado ou não. Com a globalização, tudo que acontece em um lugar rapidamente é precificado nos ativos que são sensíveis ao tema específico. Regulamentações ajudam a precificar alguns ativos, mudanças e intervenções levam a ruídos que dificultam uma melhor análise. Isso é para exemplificar que conscientemente estamos constantemente analisando os ativos do mercado, assumindo premissas para entender qual seria o valor dos ativos e inconscientemente estamos ajustando a nossa (individual) percepção de risco.
Ao olhar de forma mais pragmática e fundamentalista, anulando a emoção e sentimento de medo de tudo que passamos recentemente, o que vemos são ativos com múltiplos bastante atrativos. Múltiplos como P/L, EV/EBITDA não só estão muito abaixo dos seus históricos, como também com desconto frente as empresas globais do mesmo setor. Sem detalhar demais, mas seguindo uma visão de volta à normalidade, com queda da inflação e queda de juros (no Brasil), temos uma visão construtiva, principalmente para os setores de mercado interno, como varejo, imobiliário, industrial e serviços. Não será um trajeto sem turbulência – obviamente, pois há uma alta na taxa de juros do FED, juntamente com uma Europa em momento forte de desaceleração, trazem muitas inseguranças. Mas olhando nossa balança, nos parece que os riscos foram bastante precificados e as oportunidades de retornos mais altos no longo prazo valem. Resta aos investidores analisarem seus perfis, e saberem se tem espaço em sua carteira para entrar ou aumentar a sua exposição à renda variável.
* Isabel Lemos é gestora de renda variável da Fator Administração de Recursos - FAR