Rodrigo Possenti*
“Momentos de crise geram oportunidades” - esta frase utilizada nos mais diversos contextos, pode até ser considerada um clichê, porém, estamos vivenciando um momento de mercado onde tal clichê pode facilmente ser aplicado: a crise pela qual o mercado de crédito tem passado nos últimos meses, com grandes empresas do setor de varejo se deparando com situações adversas. Algumas acabaram inadimplindo pagamentos e descumprindo compromissos contratuais, e nos casos mais alarmantes, solicitaram recuperação judicial, para tentar salvar a empresa de uma possível falência.
Mesmo nesse cenário algumas oportunidades florescem, no entanto, não são todos que tem estômago para explorá-las. Em um momento de incerteza, uma estratégia igualmente válida é recuar, munir-se de todas as informações disponíveis sobre o acontecido e avaliar onde você pode estar vulnerável aos eventuais desdobramentos da crise.
No universo dos Fundos de Investimentos Imobiliários, que têm um prazo de duração indeterminado, por exemplo, a preparação para momentos análogos ao que estamos vivenciando acontece na gestão do dia a dia. Como a construção de um portfólio de ativos é algo que se dá ao longo do tempo, o fundo está o tempo todo construindo os alicerces da sua carteira, que contribuirão para esta perdurar e sobreviver a momentos complicados da economia.
Algumas crises são cíclicas, outras são mais ou menos previsíveis, e os fundos que se perpetuaram ao longo do tempo, atravessando todas elas, são aqueles que utilizam de todos os recursos que têm em mãos para perseverar diante dos contratempos.
Dentre todos estes artifícios que uma equipe de gestão pode utilizar, se destaca como um dos mais relevantes a pulverização, que apresenta nuances mais profundas do que aparenta à primeira vista. Considerando uma carteira hipotética e já diversificada, essa teria aproximadamente 10 a 20 ativos, já em uma carteira também hipotética e pulverizada poderíamos considerar 70, 80 e até mais ativos, ou seja, enquanto no primeiro exemplo cada ativo representaria cerca de 10% a 5% da carteira, no segundo exemplo essa representação cai para abaixo de 2%.
Considerando como primeiro nível e mais óbvio a pulverização de uma carteira em diferentes ativos, é possível aprofundar essa pulverização em níveis mais específicos, como a geográfica, a em grupos econômicos diferentes, a em setores distintos da economia e a em garantias diversas.
Na crise da COVID-19, a tese do benefício da pulverização foi bastante testada. Enquanto vivenciávamos um cenário de pandemia e incerteza global, diversos setores da economia, como aviação, turismo, lazer, shoppings centers foram tomados de assalto e fortemente impactados, entretanto, tantos outros setores da economia se desenvolveram e tiveram resultados positivos, como varejo, medicamentos, logística, e-commerce.
Desta maneira, um fundo com uma adequada pulverização em setores diversos da economia conseguiu focar seus esforços em atuar junto aos seus ativos dos segmentos mais afetados, com renegociações de pagamentos e concessões de períodos de carência de pagamentos, por outro lado também tendo tranquilidade com os ativos dos setores que acabaram sendo beneficiados.
Essas renegociações na maioria das vezes, visto a piora do cenário, levam a uma reprecificação da dívida que, depois de analisada mais profundamente, ajuda a empresa a recompor seu caixa, fazer frente a suas dívidas de curto e médio prazo e recuperar o fôlego para enfrentar a crise. Isso consequentemente também beneficia o cotista do fundo, que por sua vez recebe um prêmio maior pelo reajuste na taxa do ativo renegociado.
Semelhante às crises anteriores, a atual crise do mercado de crédito também vai gerar boas oportunidades, onde as empresas interessadas em tomar novos financiamentos estarão dispostas a aceitar maiores spreads (prêmio que aceita pagar a maior que o título de dívida pública de vencimento similar) nas taxas de suas dívidas e uma melhor composição de garantias oferecidas. Estaremos diante de um cenário onde os melhores fundos estarão aptos a adquirir bons ativos, e estes serão integrados à carteira ativos sólidos que vem sendo construída com o tempo.
Visto que é impossível prever todas as situações que podem ocorrer, ao escolher aplicar as economias em um Fundo de Investimento Imobiliário, haverá uma probabilidade maior de se preservar estando em um fundo que se protege via pulverização, e que continuará a entregar resultados, pelo tempo indeterminado que ele tem pela frente.
*Rodrigo Possenti é head de fundos imobiliários do Fator