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Mudança na 4.994 não visa PAC
Diretor de normas da Previc, Alcinei Cardoso Rodrigues explica que alteração mira adequar Resolução a padrões internacionais

Edição 371

Rodrigues,AlcineiCardoso(Previc) 24out 01A atuação da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) foi criticada na grande imprensa, ao final de outubro, por supostamente estar fazendo propondo mudanças na Resolução 4.994, que regula os investimentos dos fundos de pensão, com o objetivo de facilitar o direcionamento de recursos das entidades fechadas para o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), do governo Federal. Puro fake-news, diz o diretor de normas da Previc, Alcinei Cardoso Rodrigues. Segundo ele, as mudanças na Resolução 4.994 têm o objetivo de adequar essas regras à parâmetros internacionais, alterar algumas nomenclaturas e incluir novos ativos ao leque de produtos disponíveis para investimentos dos fundos de pensão. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista de Rodrigues à Investidor Institucional:

Investidor Institucional - Porque a Previc publicou a Resolução 25 um ano após ter publicado a Resolução 23?
Alcinei Cardoso Rodrigues - Quando nós fizemos Resolução 23 o objetivo era colocar em um só lugar, de forma simplificada mas com muita clareza, vários normativos. E nós já sabíamos que, dentro de um tempo, poderia aparecer algum errinho, então já tínhamos a expectativa de revisitar o texto após um ano. E então saíram essas duas resoluções novas do CNPC, a Resolução 59 que trata da retirada do patrocínio, e a Resolução 60 que trata da inscrição automática, ambas precisando de vários artigos que lhes dessem operacionalidade. Foi isso que, de fato, ensejou a publicação da Resolução 25 nesse momento.

Falando sobre a Resolução 59, nem todas as patrocinadoras a aceitaram muito bem, não é?
Nós entendemos que a retirada do patrocínio é um direito do patrocinador, está na LC 109, não há questionamento sobre isso. Agora, como é um pacto de longo prazo, também tem que garantir direitos ao participante. A Resolução 59 garante a retirada, mas coloca deveres ao patrocinador, e a Resolução 25 traz a operacionalização desses direitos.

A Enel entrou com um processo pedindo que seu pedido de retirada de patrocínio fosse analisado pela regra antiga e não pela 59. Como está isso?
Nós fizemos uma regra cancelando todas aquelas entradas que não tinham sido viabilizadas até a publicação da Resolução 59. Isso, inclusive, foi estabelecido pelo CNPC, que deveria começar tudo de novo. O processo da Enel estava nessa situação, teve muita discussão mas no final a coisa está andando direitinho dentro de um processo negocial nosso. Mas isso é o diretor de licenciamento que sabe todos os detalhes, eu não acompanhei isso no detalhe não.

E em relação à adesão automática, o que a Resolução 25 traz de novo?
Foram criados vários formulários, feitos vários anexos, que permitirão dar agilidade na tramitação dos pedidos de mudança de estatutos de planos para incluir a adesão automática. Isso permite que a coisa entre num circuito de fast track.

Está tendo demanda por adesão automática, uma vez que quase não estão sendo criados novos fundos de pensão?
Tem muitas empresas que estavam com planos fechados e com esse processo de adesão automática abriram. Então existe demanda sim, eu não saberia quantificar agora, mas existe sim.

Em relação à Resolução 4.994, como estão as negociações para a mudança dessa regra de investimento?
Primeiro, eu queria dizer que o norte estratégico das mudanças da 4.994 veio da publicação da Resolução CVM 175, que muda todo o regramento dos fundos de investimento, adequando-o a vários parâmetros internacionais, alterando as nomenclaturas e trazendo novos produtos, novos ativos. Por exemplo, antes você tinha um fundo, agora você tem classe, subclasse, antes você tinha responsabilidade do gestor e do administrador, agora elas foram mais bem delineadas, ficou mais claro. Além disso, traz uma importante questão que é a da responsabilidade limitada e ilimitada, e isso foi importante porque a gente olhou e falou: opa, aí está falando praticamente de fundos de participações, então incluímos essa diferenciação na parte da 4.994 que trata dos FIPs.

Que novos produtos foram incluídos na minuta que a Previc enviou ao Ministério da Fazenda?
Por exemplo, os Fiagros. Nós incluímos um limite para Fiagros dentro do limite dos estruturados e aumentamos esse limite de 20% para 25%. Achamos que a demanda por Fiagros pode ser expressiva, mas ninguém sabe quanto, nós vamos ter que testar.

Então, o limite não é especificamente para os Fiagros?
Não, é para os estruturados, que incluem os multimercados, Fiagros, FIPs, COE e Mercado de Acesso. E como vai funcionar? Todos os ativos juntos não podem passar de 25%, porém cada um desses, individualmente, não pode passar de 10%. Antes era 20% no total e cada um podia ir até 15%, agora é 25% no total e cada um não pode passar de 10%. Porque? Porque nós estamos induzindo que a entidade, dentro de um ativo estruturado, que tem uma relação risco-retorno mais agressiva, digamos assim, tenha uma maior diversificação.

Então o FIP, individualmente, também caiu para 10%?
Sim, ao contrário do que o mercado fala, que a gente abriu tudo para ativos de infraestrutura, nós reduzimos o limite dos FIPs de 15% para 10%, porque nós estamos induzindo à diversificação. E veja que esse era um dos principais veículos de investimentos em infraestrutura.

Realmente muita gente diz que a 4.994 está sendo mudada para permitir mais investimentos em infraestrutura, para ajudar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo Federal. O que você diz sobre essas críticas?
Puro fake-news. Como você pode ver, em FIPs nós baixamos de 15% para 10%. No caso de fundos de infraestrutura, os fundos de pensão já podiam investir via debêntures incentivadas, mas não tinham apetite pelo produto pois a isenção fiscal ia para o investidor e, como os fundos de pensão já têm isenção, não tinham grande interesse. Mas com o decreto das debêntures de infraestrutura (Lei 14.801, de jan/2024), que transferiu a isenção do investidor para o emissor, esse pode usar o benefício para aumentar o spread e aí sim, fica interessante para os fundos de pensão. Então, nós incluímos os fundos de infraestrutura na minuta para dar segurança ao fundo de pensão.

Qual o limite para as debêntures de infraestrutura?
Ela entra no mesmo limite dos produtos de renda fixa que podem ir até 20%, da mesma forma que as debêntures incentivadas. A gente não alterou esse limite de 20%.

Além do Fiagro e debêntures incentivadas, que outros produtos foram incluídos na minuta da 4.994 enviada ao Ministério da Fazenda?
Tem também os ativos de carbono. A gente criou um limite específico de 5% para crédito de carbono e crédito de descarbonização dentro do range de renda variável.

Voltando aos FIPs, hoje as fundações estão bem distantes dessa classe de ativos. Como mudar isso?
É verdade, das 15 maiores fundações hoje só duas tem FIPs na sua política de investimento, sendo que uma é a do Itaú, porque a Kinea tem esse produto, e outra do Paraná, que é uma coisa bem específica, relacionada à área de celulose. Um setor importante em termos de investimentos de fundos de pensão no mundo todo, no Brasil estava destruído, por motivos diversos. Então, nossa preocupação está sendo no sentido de modernizar o normativo para dar segurança jurídica e permitir que essa classe de ativos volte a ser uma opção aos institucionais.

Como?
Mudando duas coisas. Primeiro, nós aproximamos a nossa normatização da experiência internacional ao proibirmos que os fundos de pensão tenham representantes no comitê de investimento dos FIPs. Porque, na verdade, estava tendo uma confusão e eles estavam tratando os FIPs como se fosse um investimento direto. Então, qualquer problema que ocorria dentro do private equity quem acabava sendo responsabilizado era o gestor do fundo de pensão e não o gestor do private equity.

Seria uma retirada imediata dos comitês de investimentos?
Não, na minuta estamos dando 12 meses para as entidades e os gestores de FIPs se adaptarem, fazerem a transição. Nós conversamos sobre isso com todo mundo, com os fundos de pensão, com a Abvcap (que reúne os gestores de FIPs), de fazer uma retirada organizada e trazer os fundos de participação para parâmetros internacionais. Todo mundo gostou da ideia.

Você tinha dito que tinha duas mudanças. E qual é a outra?
Em segundo lugar, nós também reduzimos a participação que uma fundação podia ter em um FIP de 25% para 15%. Antes, cada fundo de pensão poderia ter 25% do fundo, então juntava quatro fundações e podiam ser donas do FIP todo. Isso não pode mais, agora o máximo é 15% individualmente e 40% somando as participações de todos os fundos de pensão num mesmo FIP. Essa última mudança foi sugerida pelo Ministério da Fazenda, induzindo a que os fundos de pensão sempre estejam em condição concorrencial e não mais numa condição de controle total das cotas.

E a questão do FIP de ativo único, como ficou?
Isso também vai estar proibido. Nós remetemos a uma regra da CVM, a 579, que impede a EFPC de entrar em FIP de ativo único e também de entrar em fundo onde um cotista tenha um domínio total das cotas, como se fosse, entre aspas, um controlador. Ou seja, as fundações devem entrar junto com outros investidores financeiros e não ficarem subordinados a um cotista controlador.

Os investidores estrangeiros são os maiores críticos das regras atuais dos FIPs, acha que as novas regras devem agradá-los?
Achamos que sim. Os investidores estrangeiros não entravam em FIPs que tinham fundações principalmente porque elas tinham cadeira no comitê de investimentos. A gente proibiu isso, limitou a participação das fundações a 40% do fundo, o que incentiva a entrada de novos investidores, inclusive os estrangeiros, porque as regras ficam mais equânimes com as internacionais. Era muito comum ter o que o pessoal chamava de fundo espelho, um primeiro FIP investido por fundos de pensão brasileiros, com assento no comitê de investimento, e outro FIP espelho só com investidores internacionais, sem comitê de investimento. Com essas mudanças isso deixa de ter sentido.

E como ficou a questão dos investimentos em imóveis na minuta? Como fica a rega que obriga as entidades a se desfazerem de seus imóveis físicos até 2030?
Isso de marcar data para os fundos de pensão venderem os imóveis foi um absurdo, uma irresponsabilidade. Em conversa com as fundações, grandes e pequenas, todas nos relataram que foram quase que pressionadas por pessoas que, sabendo que elas têm que vender, foram até elas oferecendo valores pífios. Outra coisa, ao colocar prazo para vender, e às vezes o estoque de ativos imobiliários de uma fundação é grande, o mercado condicionava a compra de um ativo não tão bom à inclusão no pacote de um ativo de alta qualidade. O comprador dizia, você quer vender esse? Tudo bem, mas eu quero aquele também, quero a jóia da coroa, tem que ser um pacote. Então, muita gente vendeu coisa boa que não queria.

E qual a proposta de vocês em relação aos investimentos imobiliários?
A nossa proposta é voltar às regras da antiga Resolução 3.792, voltar ao limite de 8% para imóveis e acabar com esse negócio de data limite para vender. Não tem que vender mais nada, certo? Dentro do limite de 8% pode ter imóveis físicos, ter fundos imobiliários, um pouquinho de cada. Essa que é a nossa proposta. E na Resolução 23 nós reforçamos as regras para que as vendas de imóveis sejam mais seguras, com três avaliações externas, que servem como parâmetros de mercado para a venda, mas quem decide é o gestor.

E os cripto ativo, porque vocês não incluíram?
Veja, nós fizemos vários testes aqui dentro e verificamos que tem uma volatilidade muito elevada. Nós não temos nenhum preconceito contra o produto em si, porém num fundo de pensão, que é previdência de longo prazo, que é a aposentadoria das pessoas, nós precisamos ser comedidos. Isso não quer dizer que nunca vai entrar, mas nós vamos ter que estudar mais tempo esse produto.

Já tem uma data para o Ministério da Fazenda encaminhar essa minuta ao CMN?
Veja, a oportunidade de colocar a proposta no Conselho Monetário Nacional é da Fazenda. Da mesma forma que nós aqui temos o nosso ritmo em tantas coisas, a Fazenda também tem. Mas o que precisa ser dito é que a Previc e a Fazenda, no conteúdo das propostas de mudanças, estão bastante alinhados.

Embora vocês possam estar alinhados com relação às mudanças na 4.994, há uma divergência em relação à marcação do passivo dos planos. A Fazenda quer que seja na curva. Como você vê isso?
Quando eles colocaram o tema da marcação do passivo na curva eles falaram: olha nós achamos isso. E propuseram: vamos aprovar os dois juntos? Nós viramos e falamos: desculpe, mas na minuta da 4.994 a gente tem autonomia para propor e nós estamos fazendo isso, mas o outro item (marcação do passivo na curva) não é da nossa alçada. Aliás, não é da alçada nem da Fazenda. Esse é um item que é do Conselho Nacional de Previdência Complementar, que inclui fundos de pensão, patrocinadoras, participantes, atuários, associações etc. Então, temos que conversar com a comunidade de previdência.

Mas qual a opinião da Previc sobre o tema?
Não vou mentir para você, como a gente é muito próximo do sistema nós sabíamos que a Abrapp era contra, que a Anapar era contra, inclusive todos eles soltaram notas sobre o assunto. Mas nós falamos ao doutor Marcos Pinto, da Fazenda, o seguinte: olha, sobre esse assunto nós não temos autonomia para negociar, e claro que isso gerou um desconforto.

Qual é a expectativa da Previc sobre o encaminhamento da proposta de mudança da 4.994 pela Fazenda ao CMN?
Bem, nós temos a expectativa de que, dado que a CVM 175 foi entrando em plenitude por fases, com outra fase sendo implementada agora em novembro, a resolução com as mudanças na 4.994 saia ainda neste ano. Caso contrário, nós vamos ter problemas, não vamos poder comprar debêntures de infraestrutura, não vamos poder comprar Fiagros, não vamos poder proteger as fundações que querem investir em private equity usando o conceito da responsabilidade limitada. São coisas que estão na nossa minuta e que o sistema precisa para se fortalecer.