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Governança global fraca induz à conservadorismo em investimentos

Jorge Simino1VivestO forte conservadorismo que se observa hoje entre os investidores no Brasil e no mundo não aconteceu por acaso. “Depois de 15 anos convivendo com taxas de juros reais negativas e com uma liquidez absurda, a economia global precisou se adequar a uma nova realidade que desconstruiu tudo o que havia sido construído em teorias econômicas acima a linha do Equador”, avalia Jorge Simino, diretor de investimentos da Vivest durante palestra o Fórum Perspectivas Brasil 2023 da Investidor Institucional nesta quinta (27/4). “A crise de 2008 teve um custo alto, de pelo menos US$ 4 trilhões no balanço do Federal Reserve dos EUA. Com a pandemia, esse custo subiu para US$ 9 trilhões e aí veio a guerra na Ucrânia, que mandou todos os preços de commodities para o espaço e gerou estresse adicional, extra-econômico”, aponta.
Para agravar a situação, o banco central americano errou no diagnóstico de inflação, considerada como “passageira”; errou na implementação da dose do remédio porque elevou o juro de 0,25% para 5% em um ano, e errou na supervisão, como ficou demonstrado pela quebra do banco de Silicon Valley em São Francisco. Ou seja, se o Fed fosse uma escola de samba, teria sido rebaixada, brinca.
“Há um problema sério de governança global e isso induz ao conservadorismo nos investimentos. O cenário é de imbroglio econômico e geopolítico, com pressões sobre o sistema financeiro e a capacidade de socorro foi reduzida, com o aumento da dívida em poder do público nos EUA”, diz. Esse imbroglio é muito grande e relativamente subestimado vis a vis a qualidade da governança e das lideranças internacionais.
O quadro doméstico, por sua vez, não é muito diferente. “A situação herdada pelo governo é muito complexa, há os problemas da arrecadação e da reforma tributária, além de um complexo problema de governança que atinge inclusive o judiciário", aponta. Do lado micro, há o reflexo de tudo isso sobre as empresas, o que compromete a alocação em renda variável, diz o diretor da Vivest, que está atualmente com um percentual próximo a apenas 8% de seus investimentos alocados em renda variável.
O cenário doméstico é complexo no macro e no micro. “Dado esse cenário, os fundos de pensão brasileiros, que passaram três anos sem atingir suas metas, vão querer tomar risco? O cenário de curto prazo é difícil para as EFPC”, aponta.
Para os que argumentam que o horizonte dos fundos de pensão é de longo prazo, ele lembra que a Vivest pagou R$ 4,4 bilhões em benefícios em 2022, ou seja, é importante notar que o "longo prazo também chega". Há ainda um detalhe técnico relevante: há 25 anos os fundos multimercados não existiam, nem os planos VGBL/PGBL. Hoje os multimercados têm R$ 1,8 trilhão de patrimônio e as EFPC têm que conviver com esse novo modus operandi no mercado de capitais. “É como na savana africana, em que as fundações são os elefantes caminhando lentamente enquanto os multimercados correm muito rápido”, compara.
Recentemente, ele lembra que os multimercados zeraram suas carteiras por causa de uma pequena variação no IPCA, o Ibovespa caiu e nem havia fundamento para isso. “Esses fundos geram um movimento que não tem nada a ver com o perfil das EFPCs. Tomar risco? Acredito que dá para esperar cinco a seis meses até ver como as coisas evoluem”, diz.
Guilherme BenitesAditusMetas e perfis - O sócio da consultoria Aditus, Guilherme Benites, explicou que um estudo realizado pela consultoria com um grupo de 120 EFPCs detectou que os últimos três anos foram difíceis porque as rentabilidades caíram porque ao mesmo tempo em que as metas atuariais subiram, com poucas conseguindo superar a meta. Em 2022, 25% a 30% das entidades acompanhadas pela consultoria bateram suas metas, mas quando olhamos o período de 2020 a 2022, apenas 10% dos planos conseguiram isso. “É um percentual muito baixo e foram principalmente os planos CD que conseguiram bater metas”, diz Benites.
A questão é que hoje as carteiras conseguem entregar isso porque o CDI paga 7% reais, mas isso não vai continuar por muito tempo. “Passamos um ano e meio olhando para o CDI mas ele não vai mais resolver o problema porque o juro terá que cair”, avisa.
“Estamos vindo de um período de três anos de sofrimento, em que as metas não foram batidas, principalmente em 2021, e indo para um período de juro ainda alto por algum tempo e portanto com metas que continuarão a subir”, diz.
Ao mesmo tempo, a alocação segue concentrada em renda fixa e a renda variável está em percentual médio abaixo de 8%. Isso acontece porque a correlação entre o CDI e a renda variável é negativa e hoje os portfolios vivem uma situação de “imenso conservadorismo” que já vem sendo construído há alguns anos. ”Para maior azar, tivemos um grande problema de crédito no momento em que estamos mais conservadores. E estamos mais conservadores porque o mercado oferece oportunidades para isso em função do juro alto. Outro motivo é que as EFPCs vêm de um contexto difícil, de três anos sem bater metas”, argumenta. A grande pergunta é o que haverá pela frente, já que o atual patamar da Selic não pode continuar.
A pressão sobre as fundações também vem dos planos com perfis de investimento, explica o consultor. “Na nossa amostra, 50% dos participantes desses planos migraram dos perfis mais agressivos para os mais conservadores. Entre junho de 2021 e dezembro de 2022, os conservadores passaram de 45,5% para 67,5%, enquanto os perfis agressivos caíram de 22,5% para 13% e os perfis moderados, que representavam 32% dos participantes, recuaram para 19,5%. “Isso torna mais difícil a elaboração de estratégias de longo prazo. E é preciso refletir porque não podemos ter fundações que precisam pensar em planos de 20 a 30 anos mas o gestor precisa fazer estratégias que vão durar seis meses”, diz.
Uma alternativa seria, além de trabalhar a educação financeira do participante, colocar travas em alguns planos para minimizar as migrações entre perfis e proteger os participantes deles mesmos, acredita Benites. “Eles não podem encarar o dinheiro do fundo de pensão do mesmo modo que o investimento que operam nas plataformas”, diz. Outra alternativa é ir para o lado do modelo ciclo de vida, o que pode melhorar a percepção de risco do participante.
Luiz Philipe BiolchiniBramFim do ciclo - Para Luiz Philipe Biolchini, CIO da Bradesco Asset Management, que mediou o painel de palestras, o fluxo de recursos dos últimos dias demonstra que o investidor continua na linha do conservadorismo. “Nos últimos três anos, combate à inflação e juros em alta depois de décadas, o ambiente ficou difícil. Mas nos parece que estamos no fim do ciclo de elevação dos juros, os EUA podem subir mais 0,25% e parar, então quando olhamos para a frente já vemos um ambiente de política monetária diferente”, afirma.
No Brasil, Biolchini avalia que todas as classes de ativos finalmente incorporaram os prêmios e já há uma correção significativa no crédito, com a volta dos prêmios. “O cenário macro começa a ficar mais favorável e podemos estar na antevéspera de um ambiente mais positivo, agora com prêmios”, acredita.